quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Eu, eu mesma e o blecaute da Coelce


- Puta merda!Faltando energia no bairro todo, como é que vou descer do carro e abrir o portão??E se tiver um ladrão que não tou vendo?!
- Calma, liga a luz alta, olha bem...olha alí!O vizinho tá te dando sinal com o celular, deve tá dizendo pra tu entrar que ele tá olhando, qualquer coisa ele liga pra polícia.
- Ele tá sacudindo o celular!E se ele tiver dizendo pra eu não entrar? Que tem alguém?
- Vai!
- Devia ter ficado lá na Dandara!
- Vai voltar? Nem gasolina tu tem pra chegar lá!
- Ai meu Deus, ai meu Deus! Vou!Ai meu Deus..eu não acredito em Deus, e agora? Se ele existir e não quiser me ajudar já que nunca acreditei nele?
- Se ele existe, se ele é mó limpeza como dizem..Ele vai entender e ficar feliz porque você enfim chamou por ele. Ele não é superior a nós? Então...Vai.

Abro o portão.
- Vaaaai, corre!
- Fecha, fecha!

Fechei.

- Casa escura da porra..Ai que medo.
- Medo de que?
- Sei lá.
- Acende o isqueiro.
- Num tem nenhuma vela nessa casa, afff!
- Mamãe deve ter alguma perto do altarzinho dela.
- A louca que vou lá! Morro de medo daquelas imagens.
Click
- Tenho que beber água, senão a ressaca vai ser foda.
- Porra, tá queimando meu dedo, vou no escuro, já conheço o caminho.
- Ai que medo, ai que medo!
- De que?!
- Espírito, demônio, sei lá!
- Desde quando tu acredita nessas coisas?!
- É mesmo, é viagem da minha cabeça. Frescura é essa agora? Aaaai que medo!
- Ufa! Entrei no quarto!
- Vou colocar meu celular pra carregar, assim fico com a luz dele.
- Que bixa burra! Como é que carrega sem energiaaaa??
- Caramba...Só quando ela falta que a gente percebe o que vem dela e o que não vem.
- Quando eu era criança não entendia porque que quando faltava energia não faltava água.
- Burra.
- Sei lá...Tudo precisava de energia!
- Dorme.
- Que barulho foi esse?!
- Vento nas plantas.
- É ladrão!
- São as plantas!
- É ladrão nas plantas!
- Já viu um pé de ladrão?
- A Bia já viu o pé de um ladrão nas plantas.
- A gente tá tão acostumado com a tecnologia que tem medo dos barulhos da natureza, buzina de carro ninguém se assusta!Mas planta dançando ficamos com medo...tsc tsc.
- É chuva? Tomara que seja chuva! Assim esse calor passa!
- E vai deixar a Nina na chuva? Vai ter que descer no escuro pra abrir o portão pra ela.
- Tomara que não seja chuva! Tomara que não seja chuva! Ai meu Deeeeus.
- Lá vem tu falar nesse cara de novo.
- Não pensa assim, ele pode ouvir. Dizem que ele escuta até pensamento!
- Eu acredito em Deus, eu acredito em Deus, eu acredito!!!
- Deixa de ser mongol, ele não existe, nem espírito, nem tem ladrão lá embaixo!
- É mesmo, né? Tou viajando..O que dá medo não é o escuro, é a ausência de luz.
- Redundante.
- Nã-nã-não.
- Que barulho é esse? Que barulho é esseeee?!
- Fecha a janela!
- Dorme, dorme, dorme!!

" I used to be schizophrenic, but we're ok now."

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Fui parar no Pará a pé.

Ah mas eu vou contar que eu tive lá pelo Pará..
No Tucupi desci a mão, mas não quis saber do Tacacá.
Em Benevides fui no Casarão da finada Santa Paula, passei pelo Bar do Ceará e dobrei no Raio de Luz. Conheci um cara chamado Sol e com sua filha Eva me pintei de índia.
Uma cidade sem Coca-cola, mas com Igreja Universal. Tomei um Fly com gosto de cachaça. Da feijoada comi apenas o feijão e o porco morto com certeza teve uma vida muito feliz. As formigas me ignoraram e eu me encantei com uma galinha de botas.
Em Belém ouvi uma paraibana falar de Paulo Freire e educação popular, questionei a ligação entre educação e regulação.
Diretrizes, PPP, ênfases, crises...Ouvi que ser crítico é muitas vezes sinônimo de ser chato. Concordei. Um cearense baixinho e invocado falou que na universidade se aprende a ficar calado.
Falamos sobre saúde pública e compramos ervas no Ver o Peso. Bebemos num bar onde moças de família não bebem e me protegi da chuva lá, numa casinha sem janelas.
Saudação Ananindeua.
Fomos pra Icoaraci com meu amigo, um ex hippie que ainda ta nos anos 70.
Do tecno-brega por algum tempo conseguimos fugir.
Então vamos lá falar sobre direitos humanos, diversidade sexual e homofobia..Me diz o que você faz com a faca, afia ou enfia?
Da Chiquita eu quero ser filha!
Saúde mental, luta antimanicomial...Conheci um tripolar que não gosta de aviões.
Com o frentista fiz amizade em Mosqueiro, comi a melhor tapioca que já provei até hoje, virei o Taz.
Deixei as máscaras e auto-repressões em casa, ouvi de uma carioca que sou carismática.
Cuidado com o uso insustentável dos meios de sustentação da vida.
Em "Vai quem quer" fui uma estrela do mar, um peixe palhaço e um mandão num “mar de água doce”.
Lembrei do meu avô, fiz amizade com um vira-lata e a ele dei o nome de Kelvin.
O carioca foi confundido com baiano, o paulista era gente boa porque morava no Rio, vi o Catatau e cantei Belchior.
Quem lida com a saúde mental de quem lida com a saúde dos outros?
Vi um filhote de tigre, macacos engraçados, com a políciapeguei carona, andei num pau de arara puxado por um trator, num barco onde não podia fumar enlouqueci, em rodas de conversa se fui tímida um dia me esqueci.
Fui numa festa ao avesso, onde a Pícara Sonhadora parecia a Pokahontas e na água a Juma Marruá. Mas quem ganhou o concurso foi minha amiga Consuelo, com quem fiz uma paródia de uma música da Lady Gaga (a gata ta mesmo em todo lugar).
No rio não podia pular, a Denise não jogava ponta de cigarro no chão, minha barraca alagou e passei a ter uma banheira de hidromassagem, dormi numa sala com mais 20 pessoas e lá fedia a cachaça com mau-hálito, peguei no sono enquanto ouvia um sexo selvagem.
Conheci muita gente e um pouco mais a mim mesma.
Voltei pra Fortaleza pensando que tudo ia estar do mesmo jeito, mas ta tudo diferente.